quarta-feira, 5 de junho de 2013

RITUAL PARA UMA METAMORFOSE




Como escrevemos aqui, a Comédie-Française apresenta, desde 18 de Maio, a peça Rituel pour une Métamorphose, do dramaturgo sírio Saadallah Wannous. É a primeira vez que o Français apresenta uma peça árabe (em tradução francesa), o que não causa verdadeira admiração, tal é o atraso com que aquela veneranda instituição leva à cena os mais famosos textos da dramaturgia contemporânea, inclusive de autores franceses.

Saadallah Wannous (1941-1997) nasceu em Hussein al-Bahr, perto de Tartus, tendo estudado jornalismo no Cairo. Foi editor cultural do jornal sírio "Al-Baath" e do jornal libanês "As- Safir". Em 1965, partiu para Paris, para aí estudar teatro, sendo influenciado pelas diferentes correntes do teatro europeu. De regresso à Síria, escreveu cerca de 20 peças de teatro, que vieram a influenciar profundamente todo o teatro árabe contemporâneo. Apoiando-se no património árabe clássico, criticou incansavelmente os laços entre o indivíduo e o poder.

Foi o criador do primeiro festival de teatro da Síria, e da revista "A Vida do Teatro". Deve-se-lhe igualmente a fundação do Instituto Superior de Teatro da Síria. Considerado um dos grandes homens de teatro da língua árabe, morreu prematuramente em 1997, sem que o seu nome alcançasse no Ocidente a projecção de que goza, por exemplo, o poeta sírio Nizar Qabbani (1923-1998)

A sua peça Rituel pour une Métamorphose passa-se em Damasco, no fim do século XIX, e tem por enredo um caso de costumes que metamorfoseia os protagonistas de uma sociedade em crise. Não faltam um mufti ambicioso e concupiscente, uma dama que se torna cortesã, dignitários oportunistas e venais, casas de prostituição e mesmo a abordagem, coisa rara no teatro árabe da época (o original árabe é de 1994 - Tuqûs al-ishârãt wa al-tahawwulât), de um caso de homossexualidade.

Pela sua construção, pela riqueza do texto (na versão francesa, e certamente ainda melhor em árabe), pela originalidade do tema, esta obra de Saadallah Wannous é, sem dúvida, uma das melhores peças de teatro que li nos últimos anos.




1 comentário:

Pedro V F Madureira disse...

Gosto de cinema mas devo confessar que infelizmente detesto teatro.
Porquê ? Provavelmente por ter assistido a tantas borracheiras e chatices pseudo intelectuais nesta nossa terra. Mas fico de apetite aguçado para, pelo menos, ler esta peça que nos é sugerida pelo "nosso" enciclopédico Júlio..