domingo, 3 de abril de 2011

LITERATURA E LITERATICE



Conforme referi, foi publicado há dias o livro Contra a Literatice e Afins, de João Gonçalves, autor do blogue "Portugal dos Pequeninos".

Em consonância com os posts que tem editado no seu blogue, João Gonçalves insurge-se contra a imensa porcaria que é hoje dada à estampa sob a classificação de literatura quando não passa de pura literatice, sem conteúdo nem forma.

O livro, escrito no tom provocatório que caracteriza o autor, denuncia todos os que nos tentam fazer engolir gato por lebre, com especial evidência para os jornalistas agora transformados em escritores de obrigatório sucesso. Especialmente se se trata de jornalistas televisivos, mas não só eles.

Passando em revista o acto de escrever e o acto de ler, debruça-se João Gonçalves sobre a obra de diversos escritores, uns vivos, outros que já passaram para o além eterno, prestando uma especial homenagem a Jorge de Sena, um dos seus autores favoritos.

Na verdade, Jorge de Sena é seguramente uma das maiores, senão a maior, figura intelectual portuguesa da segunda metade do século XX. Engenheiro de formação, abordou todos os géneros literários com uma lucidez e uma competência que falece a muitos que se especializaram nas matérias literárias.

Sena, que morreu amargurado por nunca ter recebido na sua pátria o reconhecimento a que julgava ter direito, é ainda hoje um escritor modestamente conhecido do grande público, que consome hoje  toneladas de papel onde estão plasmados devaneios que decorrem de puras masturbações mentais, que nem físicas chegam a ser.

Diz-se que Sena, após a Revolução de Abril, não foi chamado a Portugal porque tinha mau feitio. Talvez não fosse aquilo a que se chama uma pessoa fácil. Pelo desgosto do exílio, por não ter sido reconhecido (certamente por inveja) pelos seus colegas de ofício (o meio académico é um vespeiro onde triunfa normalmente a mediocridade e o compadrio), quiçá por razões de natureza estritamente pessoal.

Deve-se-lhe todavia uma imensa e diversa obra. Quero recordar aqui que foi Jorge de Sena quem primeiro traduziu para português uma parte dos sonetos do poeta grego de Alexandria Constantino P. Cavafy, uma das figuras máximas da literatura universal de todos os tempos, de quem um verso constitui a epígrafe deste blogue. Bastava esse "serviço" às letras portuguesas para conferir a Sena um lugar ímpar na nossa cultura contemporânea.

E não posso deixar de referir que o livro de João Gonçalves (tal como o blogue onde escrevo) não respeita o recente acordo ortográfico, cuja adopção constituiu um acto vergonhoso da governação portuguesa.

1 comentário:

Anónimo disse...

Até que enfim, que se refere esse acordo vergonhoso e ímpar na nossa história. Vergonha das vergonhas, pois significa o abdicar de tudo aquilo que uma pátria tem de mais importante, a saber: a sua língua. Não são as bandeiras nem os hinos nem outras coisas de cariz meramente transitório, não! uma pátria é a sua língua e nada mais! Tudo o resto são masturbações mentais, como muito bem refere o autor num outro post recente.
Marquis