sexta-feira, 31 de julho de 2009

O RIDÍCULO MATA


Há dias, realizou-se no Largo do Teatro de S. Carlos um "espectáculo", que não vi, que segundo a comunicação social consistiu na apresentação de um Manifesto Anti-Dantas, em que o escritor e académico foi substituído pelo encenador Ricardo Pais. Acerca do ruído provocado pelo evento publiquei um comentário no blogue Portugal dos Pequeninos, em 23 deste mês, em que manifestei o meu apreço por Júlio Dantas, figura literária que a maior parte da intelligentsia nacional se habituou a apoucar, uns porque nunca o leram e nem sequer conhecem a sua obra, outros porque são estúpidos, outros por razões de natureza política, outros porque ingressaram no rebanho dos maldizentes. Como então escrevi, não me interessam os "vícios privados" ou as "públicas virtudes" de Ricardo Pais, o que não me impede de pensar que a performance deve ter constituído manifesto disparate.

Eis senão quando, abrindo o PÚBLICO de hoje, me espanto com toda uma página do caderno "ípsilon" preenchida com um "Agradecimento ao muito iglantónico Ricardo Pais", isto é, um contra-manifesto de desagravo, assinado por Francisca Carneiro Fernandes e Nuno Carinhas, enaltecendo a obra do ex-director do Teatro Nacional de São João. No mais puro estilo das manifestações de desagravo que eram comuns no Estado Novo e que foram tão acerbamente criticadas.

Pois é, se o ridículo matasse...


OS PARQUÍMETROS

Antigamente a rua era de todos. Com o andar dos tempos, e dos carros, foi-se retirando aos cidadãos a utilização grátis desse espaço público. As cidades foram progressivamente dotadas dessas máquinas vorazes destinadas a esportular aos mortais possuidores de uma, ainda que modesta, viatura uns tantos cobres para aumento do pecúlio das edilidades, directamente ou através de terceiros, isto é, de empresas vocacionadas para aplicar multas e imobilizar automóveis.

É claro que as grandes cidades (mas o esquema também logo se aplicou às pequenas) não comportam todos os veículos que pretendem estacionar. Mas o problema não diz apenas respeito aos carros que se movimentam mas também aos que ficam às portas das casas, mesmo das mais recentes, porque as câmaras municipais, por razões que a razão não desconhece, aprova projectos em que não figura a obrigatoriedade de reservar estacionamento para os moradores.

A taxação das ruas tem sido implementada com uma cínica discrição. Primeira só aos dias de semana, depois também aos sábados, finalmente todos os dias; primeiro só umas horas, depois das 9 às 17 h, a seguir das 8 às 18 h, depois até às 20; por fim 24 h por dia. Entretanto surgiram também parques subterrâneos ou em altura, para acolher todos os carros que precisam de estacionar, e isto a preços excessivos.

Reportando-me especialmente a Lisboa, é evidente que muitos dos cidadãos que trazem o carro para o centro ou a periferia do centro disso verdadeiramente não carecem, mas os transportes públicos são maus, aliás são cada vez piores, e existe uma emulação saloia de vir de automóvel, em parte promovida pela publicidade das construtoras, que não perceberam ainda que não está distante o momento em que já não há lugar para mais veículos.

Esta ideia de taxar o espaço público, com a invocação de razões de ordem prática que se pretendem absolutamente manifestas, assenta em pressupostos falaciosos. Eu sei que no estrangeiro também é assim, ou parecido, mas não me admiro com o facto, pois todos lêem pela mesma cartilha.

Com estas artimanhas (a juntar a tantas outras) de sacar o dinheiro do contribuinte (nome que hoje se dá aos cidadãos (e com razão), longe não virá o tempo em que teremos de pagar para sair à rua, teremos um contador ao pescoço e ser-nos-ão debitados todos os passos que dermos, possivelmente até com controlo de velocidade.

A este propósito, constato que a actual Câmara Municipal de Lisboa vem procedendo sub-repticiamente ao aumento do tempo de estacionamento pago. Verifiquei há dias que na Rua Silva Carvalho o limite de tempo, que estava fixado às 20 h, passou agora para as 22 h. Porquê, em termos racionais? Para aumentar as receitas da Câmara e eventualmente para multar condutores distraídos.

Não sei o que Santana Lopes pensa deste assunto. Mas se António Costa for reeleito presidente, à frente dessa improvável coligação com Roseta, apadrinhada por Alegre e apoiada por intelectuais e artistas certamente desatentos (ou não), receio o pior.

terça-feira, 28 de julho de 2009

O DEBATE


Acabei de ver, na SIC-Notícias, o debate entre os candidatos à presidência da Câmara Municipal de Lisboa António Costa e Pedro Santana Lopes. Confesso que não fiquei minimamente esclarecido.

E, não sei porquê, lembrei-me do eng. Fernando Santos e Castro, que foi presidente da edilidade entre 1970 e 1972 e que, há 40 anos, construiu o viaduto de Alcântara, sobre a linha do caminho de ferro Cais Sodré-Cascais. Era uma construção considerada provisória e por isso sem preocupações de beleza (ainda que a segurança estivesse garantida) mas servia uma necessidade fundamental: a passagem de veículos do lado da Estação Marítima de Alcântara para o lado da Avenida da Índia. Era intenção do presidente substituí-la mais tarde por outra estrutura, essa de carácter definitivo, que conjugasse a utilidade com a a estética. Entretanto Santos e Castro foi nomeado governador-geral de Angola. Outros presidentes lhe sucederam. O viaduto, esse ainda lá está!

sexta-feira, 24 de julho de 2009

SOBRE O NEOLIBERALISMO

O Nouvel Observateur nº 2332, de 16-22 de Julho 2009, publica esta curiosa entrevista com o escritor John Berger. Deve ler-se com atenção.

Gauche toute


Le grand écrivain britannique John Berger a fait scandale lorsqu'il a partagé le Booker Prize pour son roman «G» avec les Black Panthers. Entretien

De A à X, par John Berger, traduit de l'anglais par Katya Berger Andreadakis, Editions de l'Olivier, 215 p., 19,50 euros. Du même auteur, Dans l'entre-temps, réflexions sur le fascisme économique, Indigène Editions, 25 p., 3 euros (www.indigene-editions.fr).

Le néolibéralisme, que j'appelle le fascisme économique, règne aujourd'hui sur la planète. Le monde est une prison. Ils nous mentent et ils nous volent. Il ne faut jamais croire ce que disent nos geôliers.» Né en 1926, John Berger n'a rien, on le voit, du vieux monsieur qui sucre les fraises. Témoin le petit opuscule que cet Anglais marxiste et savoyard d'adoption vient de publier dans une minuscule maison d'édition de Montpellier, et où il analyse l'impasse économique actuelle, s'inspirant notamment du travail de Zygmunt Bauman. Mais Berger, qui pèse longtemps ses mots avant de s'exprimer en français avec un délicieux accent, est aussi un remarquable romancier -un des plus grands. Après le sublime «D'ici là», il publie un étrange livre épistolaire, correspondance entre Aïda et son amant, enfermé dans la cellule 73 de la prison imaginaire de Suse, pour faits de terrorisme. La critique féroce du capitalisme le dispute aux déclarations enflammées des amants. L'amour, la politique : c'est John Berger, en résumé.

Nouvel Observateur. - Le maître mot de votre oeuvre, c'est l'engagement ?
John Berger. - J'essaie simplement de me situer le plus au centre possible, je veux dire, au centre de l'expérience humaine. De nos jours, le centre de cette expérience, ce sont les marginaux. Marginaux qui, paradoxalement, sont les plus nombreux sur cette planète. Les sans-pouvoir comprennent les choses de la vie, quand ceux qui détiennent le pouvoir n'ont aucune idée de ce qu'est véritablement l'existence.


N. O. - Vous avez vous-même été tenté, à un moment ou à un autre, par la clandestinité ?
J. Berger. - Ca n'a jamais été jusque-là. Mais, dans les années 1950, j'ai fait partie du «Comité des 100», à Londres, qui a appelé à la désobéissance civile pour protester contre la course à l'armement nucléaire. Nous avons été surveillés, sans que cela tourne mal. Dans les années 1960, je suis allé souvent en URSS, et j'ai été assez proche d'artistes dissidents, dont j'ai pu sortir des oeuvres. En 1968, j'ai acheminé des messages pour les étudiants du Printemps de Prague. Ca ne fait pas de moi un terroriste !
N. O. - Mais si les circonstances en avaient décidé autrement, vous auriez pu tomber dans la lutte armée ?
J. Berger. - Je n'ai rien contre la lutte armée. Si j'avais eu le courage, j'aurais pu prendre les armes. Mais comment savoir ? Il est clair que je crois dans la lutte palestinienne, et dans le mouvement zapatiste au Mexique. La lutte d'Arundhati Roy, en Inde, je la soutiens complètement. Elle est d'un courage admirable. Elle a reçu énormément de menaces. Moi, quand j'ai eu le prix pour «G», et que je l'ai partagé avec les Black Panthers, ça a fait scandale. Ce n'était pourtant pas grand-chose.
N. O. - Quand vous étiez jeune, vous aviez une âme de rebelle ?
J. Berger. - Oui, j'étais rebelle. Mais pas contre mes parents. J'aimais beaucoup ma mère. Mon père a servi comme officier dans l'infanterie britannique, dans les tranchées de 1914, pendant quatre ans. Et il a été marqué par la guerre, dont il ne parlait d'ailleurs pas beaucoup. Je l'ai beaucoup respecté pour ce qu'il avait fait. J'ai été dans un internat de 7 à 12 ans, puis dans un autre, ce qui était pour eux un sacrifice car ça coûtait assez cher, et ils n'avaient pas grand-chose. A 16 ans, je me suis échappé d'Oxford. J'étais déjà très politisé !



N. O. - Votre père a compris vos positions politiques ?
J. Berger. - Politiquement nous étions opposés. Mais on a très peu vécu ensemble. J'ai échappé aux habituels conflits familiaux grâce au pensionnat. Le prix à payer, ça a été ma solitude, mais ce n'était pas écrasant. Au contraire, je pense que ça a créé de la disponibilité pour mon imagination en tant qu'écrivain. Je n'étais pas hanté par la figure du père, et pas étouffé par la celle de ma mère.
N. O. - Comment voyez-vous la France de Sarkozy ?
J. Berger. - C'est assez terrifiant de vivre dans cette France-là. La France avec laquelle je me suis identifié au commencement était la France de Camus, de Merleau-Ponty, de Lévi-Strauss. Je suis d'accord avec Badiou, c'est le retour de Pétain. C'est un argument absolument convaincant.

Didier Jacob
Le Nouvel Observateur

Né à Londres en 1926, John Berger vit en Haute-Savoie depuis les années 1970. Scénariste (il a travaillé avec Alain Tanner), peintre, il a publié en 1967 «Un métier idéal», un reportage, augmenté de photographies de Jean Mohr, sur la vie d'un médecin de campagne en Angleterre. Il est considéré comme l'un des plus grands écrivains vivants.

quinta-feira, 23 de julho de 2009

A SAÚDE

Informa a comunicação social que seis pessoas cegaram depois de uma intervenção cirúrgica no Hospital de Santa Maria. Parece que na origem, mas aguarda-se o habitual inquérito, estará um medicamento não especialmente indicado para o efeito. Todavia, esta manhã, na rádio, o director de oftalmologia do Hospital de São João, do Porto, afirmou que o medicamento oficialmente aconselhado custa 100 vezes mais do que o utilizado em Santa Maria e que, por isso, continuará a aplicar o primeiro nos seus serviços, uma vez que atribui o grave incidente agora ocorrido a outras razões que não o medicamento em causa.

Também esta manhã, no Fórum da Radiodifusão Portuguesa, Antena 1, o Bastonário da Ordem dos Médicos, Pedro Nunes, teceu algumas considerações, inteligentes, sobre o assunto e discorreu sobre o facto de se estarem a impor condicionantes de natureza económica nos tratamentos hospitalares, susceptíveis de causar sérios danos aos pacientes. Estas restrições, que reportam aos últimos governos, e a burocratização dos hospitais elevada a níveis incompatíveis com a boa prática médica, virão a ter as mais graves consequências para os doentes. Cito de memória: pergunta-se a um médico quantos doentes examinou mas não como os examinou, quantas intervenções cirúrgicas realizou, mas não com que êxito. É evidente que urge evitar desperdícios e absentismos injustificados, mas a saúde não pode ser apenas uma questão de números. Os depoimentos ouvidos no citado programa foram pungentes e Pedro Nunes esforçou-se por transmitir a ideia de que os doentes são pessoas e não coisas e de que há uma componente afectiva no exercício da medicina. E de que esta não pode estar dependente de, por vezes estúpidas, restrições orçamentais.

Diz o Bastonário que o nosso Serviço Nacional de Saúde ainda é um dos melhores da Europa Comunitária e que importa mantê-lo e melhorá-lo, o que não é possível com as políticas actuais. Diz também que os mais importantes investimentos devem ser feitos na saúde (e eu acrescentaria na educação e na justiça) e não em grandes investimentos de rentabilidade (humana e material) duvidosa.

Como é possível não haver dinheiro suficiente para uma saúde minimamente decente e é possível construir aeroportos e TGV's que custam quantias fabulosas. Como é possível permitir que criminosos de delito comum se locupletem em bancos e empresas e no mais que Deus sabe e permaneçam impunes. Para onde foram os milhares de milhões de euros que Portugal recebeu da então CEE, desde que aderiu a essa organização? MISTÉRIO!

Sabemos, já Salazar dizia, que o funcionamento do sistema democrático é caro e que Portugal era um país de parcos recursos. Agora que esse sistema democrático tenha permitido (e isto não respeita só a Portugal mas um pouco a toda a Europa dita democrática) o roubo sistemático dos dinheiros públicos, a constituição de fabulosas fortunas da noite para o dia e a clamorosa impunidade dos ladrões, isso já é demais.

Por isso, que ninguém se admire se mais tarde ou mais cedo o Povo começar a reclamar pelo regresso à Ditadura!

terça-feira, 21 de julho de 2009

TEMPORADA EM S. CARLOS

As temporadas de ópera no Teatro Nacional de S. Carlos vão de mal a pior. A programação anunciada para 2009/2010, para lá de indigente, resulta de critérios (se critérios houve) de selecção no mínimo estranhos. Esta Casa, que durante mais de meio século apresentou o repertório tradicional, as óperas portuguesas e, progressivamente, as novas criações contemporâneas, em espectáculos de nível internacional e com interpretações que fizeram inveja às congéneres europeias, está reduzida a uma "apagada e vil tristeza", de que se dá conta o post do blogue "Portugal dos Pequeninos", de 18 deste mês, de que transcrevo o seguinte trecho:

««Desta vez Jorge Calado acerta até pelas comparações oportunas que faz. Dammann é das piores coisas que caíram em cima do nosso único teatro lírico onde o verdadeiro director continua a ser Mário Vieira de Carvalho. Pinto Ribeiro afirmou não concordar com a gestão em curso - a OPART - mas não mexeu uma palha. Estão todos bem uns para outros. Todavia, o público e os contribuintes é que não devem suportar tanta esperteza saloia sob a capa de um cosmopolitismo de paróquia. Como escreve Calado no Expresso, «registe-se que a Vlaamse Opera (a segunda casa de ópera belga) tem nove [produções contra seis por ano no S. Carlos], a Netherlands Opera tem 15 e a Ópera Nacional Finlandesa tem 14. Todas nações pequenas, sem grandes tradições operáticas [contrariamente ao Teatro de Lisboa] (...) que já foi de Gigli, Mödl, Kraus, Gorr, Schöffler, Resnik, Zampieri e Theodossiou.» Mais. «O que Christoph Dammann, director artístico do teatro, tem feito desde a sua conturbada nomeação é, a vários títulos, desastroso. Com as excepções que só confirmam a regra, as escolhas de repertório, de produções, elencos e maestros revelam uma gritante incompetência, reconhecida à esquerda e à direita (...). Dammann esconde-se atrás de uma pseudolealdade para com os artistas que convida, mesmo maus. A lealdade primeira deveria ser para com o público português que lhe paga (...). O problema, meus senhores, não é a falta de estrelas e de cantores caros. O problema são os maus cantores, os maestros desadequados, os encenadores patetas, o pouco respeito pelo público (...). O Estúdio de Ópera é menos um laboratório de pesquisa e formação e mais um truque para fazer mais e baratinho (três títulos entre Novembro/Dezembro) (...). O Opart e a actual direcção do São Carlos desfazem-se em estatísticas para provar a bondade das mudanças. Para eles, a ópera são números, não são pessoas.»»

Que saudades do dr. Serra Formigal e da Companhia Portuguesa de Ópera, que durante anos residiu no Teatro da Trindade!

quinta-feira, 16 de julho de 2009

HERBERT VON KARAJAN

Completam-se hoje 20 anos sobre a morte (16 de Julho de 1989, em Anif, localidade a sul de Salzburg) de Herbert von Karajan, um dos mais notáveis maestros do século XX, que dirigiu a Orquestra Filarmónica de Berlim durante trinta e cinco anos.

Nasceu Karajan em Salzburg, em 5 de Abril de 1908, estudou piano no Mozarteum de Salzburg e, dado o seu evidente talento, foi encorajado pelos professores a seguir a carreira de director de orquestra. Estreou-se em 1929, no Festspielhaus de Salzburg com a Salome, de Strauss, dirigiu em Ulm e fez a sua estreia no Festival de Salzburg em 1933. No ano seguinte, dirigiu pela primeira vez a Wiener Philharmoniker e de 1934 a 1941 foi director da Ópera de Aachen. Em 1935 iniciou uma brilhante carreira internacional, que o levaria às principais salas de ópera e de concerto de todo o mundo e que só terminaria com a sua morte. Regeu pela primeira vez a Berliner Philharmoniker em 1937, da qual viria a ser nomeado director musical vitalício em 1955 (o quarto), sucedendo a Wilhelm Furtwängler, depois de Hans von Bülow e Arthur Nikisch. Por morte de Karajan, foi escolhido para dirigir a Orquestra o maestro Claudio Abbado, que renunciou por motivos de saúde, sendo substituído por Simon Rattle, que é o actual director.

Em 1939, Karajan dirigiu Die Meistersinger em Bayreuth, mas devido ao seu hábito de reger de cor, sem partitura, teve um pequeno lapso que obrigou a interromper a ópera, o que, segundo Winifred Wagner, motivou o desagrado de Adolf Hitler, que assistia ao espectáculo, como era seu hábito, quando decorria o Festival no teatro que fora mandado edificar por Luís II da Baviera. Contudo, devido à admiração que lhe tributava Hermann Göring, Karajan pôde dirigir a Berliner Staatskapelle, a orquestra da Berliner Staatsopera, de 1941 a 1945, onde regeu mais de 150 representações.

Em 16 e 17 de Maio de 1968, Karajan dirigiu em Lisboa, no Coliseu, a Berliner Philharmoniker, inaugurando o XII Festival Gulbenkian de Música, em dois concertos memoráveis, a que tive o inolvidável privilégio de assistir.

Mantém-se ainda hoje a controvérsia quanto às convicções ideológicas e políticas de Karajan. É um facto que o Maestro se inscreveu no Partido Nazi (o NSDAP-Nationalsozialistische Deutsche Arbeiterpartei) em Salzburg, em 8 de Abril de 1933, e embora em Junho desse ano o Partido fosse declarado ilegal pelo governo austríaco a filiação manteve-se válida até 1939, data em que as autoridades centrais do NSDAP a consideraram sem efeito, tendo inscrito retroactivamente Karajan como membro, em Ulm, com data de 1 de Maio de 1933. Todavia, parece hoje evidente que a adesão ao Partido Nazi se deveu principalmente à possibilidade de evolução da sua carreira e não por especiais convicções políticas. Acresce ainda o facto da segunda mulher de Karajan, Anna Maria Sauest, ter um avô judeu, o que o levou a procurar manter-se nas boas graças do regime. Como outros regentes famosos que não se expatriaram durante o período nazi, por exemplo os alemães Hans Knappertsbusch e Wilhelm Furtwängler e os austríacos Clemens Krauss e Karl Böhm, Karajan continuou a dirigir na Alemanha e na Áustria durante o regime do Führer, e ainda regeu um concerto em Berlim em 18 de Fevereiro de 1945, após o que partiu para Milão. Aí, e porque os teatros alemães estavam destruídos ou encerrados, contou com o apoio do seu amigo e eminente maestro italiano Victor de Sabata, que também sofreria alguns incómodos por ter mantido a sua carreira em Itália durante o consulado de Mussolini. Vem a propósito referir que, em 1953, De Sabata dirigiu, na sua única gravação comercial de ópera, uma Tosca, com Maria Callas, Giuseppe di Stefano e Tito Gobbi, que é considerada a obra-prima das gravações operáticas.

Sobre a participação de Furtwängler em espectáculos com a presença de Hitler e as inquirições a que foi sujeito pela chamada Comissão de Desnazificação criada pelos Aliados no pós-Guerra, deve ler-se a peça Taking Sides, de Ronald Harwood, que foi passada ao cinema pelo realizador István Szabó. Em 18 de Maio de 1946, Karajan foi ilibado das acusações que sobre ele pesavam de cumplicidade com o regime de Hitler e retomou a sua carreira de maestro na Alemanha e no mundo.

Para lá da sua presença no palco, dedicou-se também o maestro à gravação discográfica, através de várias editoras, nomeadamente a Deutsche Grammophon, que com ele, e com as mais importantes orquestras e os melhores solistas, produziu dezenas de obras musicais, primeiro em vinil e depois em disco compacto, sendo notáveis as suas interpretações de Beethoven, Wagner, Richard Strauss, Mahler, Bruckner, Verdi, Puccini ou Schoenberg. Durante a sua longa carreira, Karajan recebeu diversas distinções, nomeadamente o grau de doutor honoris causa pela Universidade de Oxford e o Prémio Internacional de Música da UNESCO.

Notabilizou-se Karajan por um estilo muito pessoal de regência e pela sua leitura especial das partituras que, aliás, costumava dirigir de cor, graças a uma extraordinária memória e a um apuradíssimo ouvido musical. Preocupou-se também o maestro com as características técnicas das gravações em disco, sugerindo modificações e exigindo aperfeiçoamentos e materiais novos, um pouco ao jeito do que fizera Leni Riefenstahl, quando pediu à AGFA a criação de um novo tipo de película para os seus filmes. Sustentam os opositores de Karajan que o maestro não tinha uma postura democrática e que se comportava ditatorialmente ao conduzir as orquestras. Importa, por isso, salientar que se há área onde a democracia não funciona é na direcção de uma orquestra; esta toca como um todo, sujeita à orientação de quem a conduz e servindo uma determinada interpretação da obra em causa, e nem poderia ser de outra maneira, sob pena de produzir uma peça híbrida e esteticamente ilegível.


Interessou-se igualmente o maestro pelos desportos e pelas novas máquinas, sendo um exímio condutor de automóveis de alta cilindrada e um apaixonado pela pilotagem de aviões, sendo ele que comandava habitualmente o seu avião particular.

Porque a carreira de Karajan está indissociavelmente ligada à Berliner Philharmoniker, importa fazer algumas referências a esta extraordinária orquestra, por muitos considerada a melhor do mundo.


A orquestra foi fundada em Berlim, em 1882, por 54 músicos, com o nome de Frühere Bilsesche Kapelle (Antiga Orquestra de Bilse), depois de um rompimento com o maestro Benjamin Bilse. Em 1887 teve lugar uma reorganização, sob a direcção financeira de Hermann Wolff e a orquestra assumiu o seu nome actual, sendo confiada a direcção musical a Hans von Bülow.

Foram directores da Orquestra os seguintes maestros:

- Ludwig von Brenner (1882-1887)

- Hans von Bülow (1887-1892)

- Arthur Nikisch (1895-1922)

- Wilhelm Furtwängler (1922-1945)

- Leo Borchard (Maio-Agosto 1945)

- Sergiu Celibidache (1945-1952)

- Wilhelm Furtwängler (1952-1954)

- Herbert von Karajan (1954-1989)

- Claudio Abaddo (1989-2002)

- Simon Rattle (Desde 2002)

Pela Berliner Philharmoniker passaram as mais importantes figuras musicais do século passado, como Hans Richter, Felix von Weingartner, Richard Strauss, Gustav Mahler, Johannes Brahms, Edvard Grieg, Leo Borchard, morto (acidentalmente) em 23 de Agosto de 1945 pelas forças americanas que ocupavam Berlim, Sergiu Celibidache e, já neste século, Daniel Barenboim, Pierre Boulez, e tantos outros que se torna impossível referi-los.


O primeiro auditório da Berliner Philharmoniker foi destruído durante a Segunda Guerra Mundial, em 1944. A partir de 1963 a Orquestra passou a residir no edifício da Philharmonie, construído entre 1960 e 1963, segundo o projecto pentagonal do arquitecto Hans Scharoun e que fica situado entre a Potsdamerplatz e o Tiergarten, na rua que tem hoje o nome de Herbert von Karajan. Entre 1984 e 1987 foi acrescentada à Philharmonie a Kammermusiksaal, desenhada por Edgar Wisniewski com base nos apontamentos de Scharoun. O conjunto faz lembrar do exterior uma tenda de circo mas trata-se de uma das melhores realizações arquitectónicas europeias de salas de música. Em Maio de 2008 verificou-se um incêndio no telhado mas os danos foram limitados e as actividades puderam prosseguir no mês seguinte.


Em 2007 foi publicado o livro Das Reichsorchester, de Misha Aster, sobre as relações da Berliner Philharmoniker com os dirigentes do Terceiro Reich (de quem era a jóia da coroa), nomeadamente com Joseph Goebbels, ministro do Esclarecimento do Povo e da Propaganda, que tutelava a Cultura, com Hermann Göring e com o próprio Hitler. Estas relações, perigosas mas com certeza inevitáveis, levaram a Orquestra a anunciar que iria investigar o seu papel durante o Regime Nazi.





segunda-feira, 13 de julho de 2009

HOMOSSEXUALIDADE E ESTADO NOVO


A revista “Pública”, do PÚBLICO de ontem, publica um extenso dossiê dedicado aos “Homossexuais – Perseguidos no Estado Novo”. Trata-se de um interessante trabalho da jornalista São José Almeida, porventura a primeira peça jornalística com tal amplitude vinda a lume num jornal em Portugal.


Procura São José Almeida fazer um pouco a história da “vida homossexual” em Portugal (Metrópole e Colónias) durante o regime de Salazar e Caetano. Relata factos autênticos e menciona pessoas (dos vivos, apenas os que se assumiram como tal, como manda a regra) e descreve episódios curiosos, muitos dos quais certamente desconhecido dos leitores e outros que muitos leitores fingirão certamente desconhecer.


Contudo, dos depoimentos recolhidos, fica a ideia que o Estado Novo exerceu sistematicamente uma acção repressiva sobre os homossexuais, o que não corresponde à verdade. Realmente, Salazar, que conhecia profundamente os homens, jamais teria a veleidade de tal atitude, que só poderia acarretar problemas para o Regime, o que ele muito bem sabia. Fiel à sua máxima de que “em política o que parece é”, também neste caso apenas lhe interessava manter as aparências e impedir atitudes públicas ostensivas que atentassem contra o ideário do Estado Novo. Digamos que neste aspecto Salazar era totalmente amoral, nada lhe interessando as preferências sexuais dos portugueses, salvo em casos muito particulares que pudessem interferir com a situação política. Aliás, Salazar convidou e manteve no Governo (e nos mais altos cargos do Estado) homossexuais conhecidos, como – e este é um caso exemplar – o seu último subsecretário (e não secretário, como vem na revista) de Estado da Presidência do Conselho de Ministros.


Conclui-se, também, da peça jornalística que só os notáveis do Regime eram intocáveis e que o Povo era preso e humilhado. Ora isto não é exacto pois se o fosse não teria havido prisões que chegassem para acolher os transgressores da moral imposta aos “corpos já batidos na bigorna dos amores proibidos pelo código aprovado”, para citar versos de António Botto. O que, na verdade, não era admitido pelo Regime era o chamado “escândalo público” que atentasse contra os “bons costumes”, que em nome de uma circunstancial aliança entre o Estado e a Igreja importava defender. Assim, apesar das disposições legais condenatórias, e só tardiamente revogadas, era mais gravosa para os interessados a “censura social” do que propriamente a condenação penal.


Citam-se nomes contemporâneos, como efectivamente ou tendencialmente homossexuais, sendo a personalidade mais antiga nomeada a Rainha D. Amélia (de quem se dizia ter por amante a Condessa de Figueiró) que é anterior ao Estado Novo. Já agora, poderiam ter sido citados três reis de Portugal: D. Pedro I, D. Sebastião e D. Afonso VI.


Há contudo, neste texto, uma lacuna gritante: a omissão de uma figura pública a vários títulos, que deverá estar a rebolar-se na tumba por não ter sido mencionada. Refiro-me obviamente a Bernardo Antunes (a célebre Dona Bernarda) que toda a Lisboa gay, semi-gay e não-gay conhecia, pessoa ligada aos meios artísticos, que habitava na Avenida da Liberdade, engatava na Baixa e se gabava de ter ido para a cama com todos os homens de Lisboa. Bernardo Antunes, que se intitulava por vezes Conde de Britiande, mas que na realidade pertencia à família dos Viscondes do mesmo nome, estafou várias fortunas, foi anavalhado por um pescador na Costa da Caparica e acabou como funcionário da Sociedade Portuguesa de Autores. Pretendia ser o patriarca dos homossexuais portugueses, depois da morte dessa outra egrégia figura, citada no artigo, que recebia, dizem, principescamente em sua casa, e que dava pelo nome de Ayres de Mascarenhas Valdez Pinto da Cunha.


Tem o dossiê agora publicado dois méritos relevantes: um é o de destacar o papel dos militares na vida homossexual portuguesa, até agora considerado um quase tabu jornalístico. Durante décadas, soldados e marinheiros, durante o período do serviço militar, mantiveram relações sexuais com homossexuais de todas as condições sociais, a troco de uma remuneração simbólica que era mais para justificar o acto e ficarem de boa consciência do que para receberem pagamento por um “serviço” prestado. Em muitos casos, esse relacionamento ultrapassou o período do serviço militar e transformou-se numa ligação para o resto da vida, mesmo depois dos mancebos serem casados e pais de filhos.


O outro mérito respeita à referência à vida gay nas antigas colónias portuguesas, durante a guerra colonial. A primeira abordagem do tema foi feita por Guilherme de Melo no livro A Sombra dos Dias, onde se descreve um ambiente de Lourenço Marques (actual Maputo) digno de uma Roma dissoluta. Parece, todavia, que Luanda conseguia superar ainda Lourenço Marques, o que dá a ideia de uma sociedade totalmente aberta às relações sexuais livres.


Aborda ainda este dossiê o caso Júlio Fogaça, membro do secretariado do PCP, que foi expulso do Partido depois de ter sido preso pela PIDE (1960), quando se encontrava na cama com um companheiro numa pensão da Nazaré. É um assunto que parece nunca ter ficado completamente esclarecido, dada a rivalidade das suas posições em relação às teses sustentadas por Álvaro Cunhal.


Espera-se que esta primeira abordagem global da vida homossexual portuguesa contemporânea (que transcende em muito as supostas perseguições sistemáticas do Estado Novo) possa ter continuação, em jornal ou em livro, mas de forma mais ordenada e documentada, a bem da história social nacional e da análise da evolução dos costumes e das mentalidades. Vasto programa.

domingo, 12 de julho de 2009

AMIN MAALOUF

Amin Maalouf, escrito libanês francófono, nascido em Beirute em 25.2.1949, esteve a semana passada em Lisboa, onde proferiu uma conferência na Fundação Gulbenkian, no passado dia 8 e deu uma entrevista a Alexandra Lucas Coelho, que saiu no PÚBLICO do dia 10.

A visita de Maalouf ao nosso país ocorre no momento da publicação da edição portuguesa do seu último livro Le dérèglement du monde (2009), em que se interroga se a humanidade atingiu o seu "limiar de incompetência moral" e onde sustenta que a desregulação do mundo tem menos a ver com uma "guerra de civilizações" do que com o esgotamento simultâneo de todas as nossas civilizações, nomeadamente dos dois conjuntos culturais em causa que são o Ocidente e o Mundo Árabe.

Autor consagrado da língua francesa, Maalouf tem escrito, especialmente, ensaios e romances. Entre os primeiros, destacam-se Les Croisades vues par les Arabes (1983), Les identités meutrières (1988) e o livro a que acima se alude; dos romances, salientam-se Léon, l'Africain (1986), Le Rocher de Tanios (1993), que obteve o Prémio Goncourt, e Le Périple de Baldassare (2000). Escreveu ainda Maalouf o libreto de duas óperas da compositora finlandesa Kaija Saariaho, L'amour de loin, estreada no Festival de Salzburg (2000) e Adriana Mater, estreada na Ópera da Bastilha (2006).

Nesta sua entrevista ao PÚBLICO, Maalouf confessa estar certo de que Obama tem uma solução para o Médio Oriente e que tem um plano para a resolução do conflito israelo-palestiniano, o que, em minha opinião, é uma perspectiva demasiado optimista, pelo menos no que respeita à sua concretização. Esperemos para ver, oxalá tenha razão. Quanto à sua convicção de que já não há civilizações, de que há uma só civilização e de que os imigrantes podem ser os intermediários fundamentais, percebe-se a ideia que lhe serve de base, mas as questões de identidade, de nações e de nacionalismos, tão vivas nas últimas décadas, não parecem favorecer essa tese. Dizer que já não há estrangeiros, que «somos todos uma nação e não podemos resolver problemas se não nos virmos assim: uma nação com muitas culturas» é uma afirmação que gostaria de poder subscrever mas em que não acredito.

quinta-feira, 9 de julho de 2009

O GUARDADOR DE PAPÉIS

Com organização de um pessoano devotado e especializado, o colombiano Jerónimo Pizarro, foram agora publicados em volume os textos (reelaborados) de oito comunicações proferidas no ciclo de conferências «O Guardador de Papéis», no âmbito das celebrações dos 120 anos do nascimento de Fernando Pessoa (1888-2008) que tiveram lugar na Casa Fernando Pessoa.

Revestindo todas as intervenções muito valia e oportunidade, julgo, contudo, dever salientar-se as comunicações relativas à biblioteca de Pessoa e ao paralelo entre as bibliotecas de Fernando Pessoa e de Friedrich Nietzsche. O conteúdo de uma biblioteca suscita sempre a maior curiosidade, e quando se trata de figuras como as referidas o interesse é redobrado.

A propósito de Nietzsche, refere Carla Gago no seu texto como a irmã do escritor manipulou alguns dos seus escritos e como o livro Wille zur Macht (A Vontade de Poder) não é uma criação original mas antes uma invenção de Elisabeth Förster-Nietzsche, composto a partir de quatrocentas notas e apontamentos do irmão, tendo o próprio título sido extraído de um comentário de Nietzsche à margem de uma página da obra Über die scheinbaren und die wirklichen Ursachen des Geschehens in der Welt ( Sobre as causas aparentes e reais dos acontecimentos mundiais), de Maximilian Drossbach. Também a famosa e polémica expressão Übermensch (Super-homem), que foi objecto de utilizações políticas posteriores seria mais correctamente traduzida de forma literal, segundo a autora da comunicação, por "Sobre-homem". Acrescente-se que a obra do filósofo, de quem Hitler era grande admirador, esteve proibida nas duas Alemanhas do pós-Guerra até à década de 80 e, nas poucas bibliotecas que dispunham de obras suas, era necessária a apresentação de uma autorização especial.

Assim, o estudo de Nietzsche desenvolveu-se mais no estrangeiro do que na sua pátria, onde só nos últimos anos a sua obra começou a ser sistematicamente divulgada. A maior parte dos seus livros encontra-se na Biblioteca Herzogin Anna Amalia, tal como os livros da biblioteca de Pessoa, mas só parte, se encontram na Casa Fernando Pessoa.

Apesar de uma certa manipulação do pensamento original do irmão, Elisabeth Förster-Nietzsche desenvolveu todos os esforços para que a sua obra não caísse no esquecimento, promovendo nomeadamente a criação do Nietzsche-Archiv, em Weimar, em 1896. Depois da morte do marido, o militante anti-semita Bernhard Förster, que se suicidou na sequência do fiasco do seu projecto ariano da «Nova Germania» no Paraguay (e não no Panamá, como é referido neste livro), Elisabeth reuniu todos os manuscritos e livros de Friedrich na casa da família, em Naumburg.

Embora tivessem muitas leituras comuns, não existe qualquer testemunho de Nietzsche na biblioteca de Pessoa, apesar do ascendente daquele na poética pessoana. Outro tanto não se dirá de Schopenhauer, que ocupava um lugar primordial na obra de Nietzsche e também na de Pessoa, mas do qual este só possuía, em tradução francesa, o Essai sur le Libre Arbitre.

sábado, 4 de julho de 2009

ELEIÇÕES NO IRÃO VI

Ayatollah Ahmad Jannati

Na sequência dos posts que publiquei anteriormente sobre a situação no Irão, solicitaram-me alguns leitores que fornecesse mais informações sobre a arquitectura do sistema político e as principais personagens.

Assim, passamos a indicar:

Guia da Revolução: Ayatollah Ali Khamenei. Eleito pela Assembleia dos Peritos, por tempo indeterminado, deve obrigatoriamente ser uma figura religiosa. Determina a política geral do país, dirige as Forças Armadas e os Serviços de Informações e nomeia, entre outros, o chefe do poder judicial, o director da radiotelevisão, os seis membros religiosos do Conselho dos Guardiães e pode demitir o presidente da República.

Assembleia dos Peritos: Ayatollah Ali Akbar Hachemi Rafsanjani (Presidente). Composta por 86 membros religiosos eleitos por oito anos por sufrágio universal. Compete-lhe eleger o Guia Supremo (e, teoricamente, demiti-lo) . Os candidatos à Assembleia são filtrados pelo Conselho dos Guardiães.

Presidente da República: Mahmud Ahmadinejad. Eleito por sufrágio universal para um mandato de quatro anos, renovável uma vez, é a segunda figura do Estado. As candidaturas são igualmente seleccionadas pelo Conselho dos Guardiães. Funciona como uma espécie de primeiro-ministro, competindo-lhe nomear os membros do Governo e dirigir o poder executivo nas matérias que não dependem da autoridade directa do Guia Supremo.

Conselho do Discernimento do Superior Interesse do Regime: Ayatollah Ali Akbar Hachemi Rafsanjani (Presidente). Composto por seis membros religiosos do Conselho dos Guardiães, pelos chefes dos poderes executivo, legislativo e judicial e, consoante os casos, pelos ministros interessados. Arbitra os litígios entre o Parlamento e o Conselho dos Guardiães e funciona como entidade de aconselhamento junto do Guia Supremo.

Conselho dos Guardiães da Constituição: Ayatollah Ahmad Jannati (Presidente). Composto por doze juristas, dos quais seis religiosos designados pelo Guia Supremo e seis (normalmente também religiosos) eleitos pelo Majlis segundo recomendação do chefe do poder judicial (o qual é nomeado pelo Guia Supremo). Verifica a conformidade das leis em relação à Constituição e ao islão. Exerce o direito de veto sobre as candidaturas às funções electivas (presidência da República, Parlamento e Assembleia dos Peritos.

Majlis (Parlamento): Ali Larijani (Presidente). Composto por uma única câmara de 290 deputados eleitos por quatro anos. Vota as leis e o orçamento. Concede ou recusa a sua confiança ao Executivo, mas funciona sob a vigilância do Conselho dos Guardiães e do Conselho de Discernimento.

Em termos sintéticos, é esta a orgânica das instituições da República Islâmica do Irão, cuja Constituição é de 1979.